‘Ninguém me tira do Sport’

Talento revelado pelo Sport e confirmado pelos campos do Brasil, o zagueiro Sandro aceitou um desafio no início do ano: voltar para o Leão depois de quase dez anos para ser o capitão do time do centenário rubro-negro. Idéia tão fixa e bem decidida, que ele chegou a recusar, no começo da temporada, uma proposta do Atlético Paranaense, vice-campeão Brasileiro e que está disputando a Copa Libertadores, e outra, mais recentemente, do Atlético Mineiro. “Vou cumprir o meu contrato como prometi ao presidente”, garantiu. Dentro de campo, ele tem fama de xerifão. “Dou o meu máximo. Não fujo do pau”. E também de artilheiro. “Já marquei 78 gols. Todos gravados, pode ir buscar no arquivo”. Assim é Sandro Barbosa Carneiro da Cunha, fora dos gramados, pai de três filhos e de 14 irmãos. “É muita responsabilidade. Às vezes dá vontade de fugir”, brinca.


Mas quem já viu Sandro encarar um Flamengo x Botafogo, num Maracanã lotado, ou Sport x Santa cruz, numa Ilha do Retiro totalmente tomada, nota logo que fugir das responsabilidades não é com ele. Em sua Academia de Futebol, em Olinda, onde 60 crianças treinam, o zagueiro concedeu entrevista à Folha de Pernambuco. Nela, Sandro comentou sobre as polêmicas criadas em torno do último Clássico das Multidões, lembrou das emoções vividas no Botafogo e revelou seus planos para quando pendurar as chuteiras.


Folha de Pernambuco – Como foi o seu início no futebol? Quem te deu mais apoio?


Sandro – Quem me apoiou primeiramente foi meu pai e depois Pedro Manta. Meus irmãos também me ajudaram bastante, mas principalmente meu pai e Pedro Manta. Meu pai por sempre acreditar em mim e Pedro Manta por ter me trazido para o Sport e me dado a primeira oportunidade. Sou grato também a Givanildo Oliveira, quem me lançou nos profissionais. Ele sempre me passou para eu ter muita calma, não ficar nervoso e jogar sem violência, mais na bola. Aprendi muito com ele no futebol, na vida, enfim, em todos os aspectos, pois Givanildo, além de ensinar a parte dentro de campo, ensina muito a de fora também. Devo muito a ele.



FP – Você participou de um time do Sport que se destacou na década de 1990. O que marcou mais naquele time e naquela época em que você foi tricampeão pernambucano e campeão do Nordeste?


S – O que marcou muito ali foi o grupo que a gente tinha. Só moleque, muita gente nova, mas todos com o mesmo pensamento. Tinha também os “coroas”, como Ataíde, Zinho e Moura que nos apoiava muito. Hoje, acho bastante difícil ser formado um outro grupo como aquele, principalmente, em termos de talento e de união.
        

FP – Outro time que você também fez parte e marcou época foi o do Santos, em 1997. Naquele ano, o Peixe conquistou o primeiro título após um longo jejum. Quais os méritos daquele time que foi campeão do Torneio Rio-São Paulo?


S – Nossa. Aquele título a gente ganhou num Maracanã lotado. Era um time muito bom que merecia ter ganho tudo naquele ano. Mas, infelizmente, a gente ficou de fora na fase final do Brasileiro. O que marcou bastante aquele time foi a qualidade, principalmente em termos individuais, porque contava com jogadores como Müller, Ronaldão, Narciso, além de Vanderlei Luxemburgo, que foi o melhor treinador que eu peguei até hoje. Ele sabe tudo, é fora do normal, e por isso está onde está.
        

FP – Você é um dos zagueiros que mais marcou gols no Brasil. De onde vem essa “vocação” para artilheiro?


S – Sempre joguei como centroavante. Isso mesmo! Quando eu era moleque jogava de atacante. Quando vim para o Sport que Pedro Manta me colocou para jogar de zagueiro. Mas eu era meia direita ofensivo. E é daí que vem essa facilidade para fazer gols. Já essa coisa de bater falta veio do meu irmão Dadaia. Ele pega muito bem na bola e por isso bate falta muito bem também. Ele sempre me deu muita força e passou isso para mim. Já cheguei a terminar o primeiro turno do Campeonato Pernambucano de 1995 como vice-artilheiro do time com 11 gols.
        

FP – Você se considera do tipo jogador-torcedor?


S – O que posso dizer é que onde joguei nunca fui vaiado em campo, porque sempre dei o meu máximo em qualquer circunstância. Pode ser no Santos, no Botafogo ou no Sport. Mas aqui isso é mais importante ainda, porque sou prata da casa. Nunca deixei de correr por nenhuma equipe. Não fujo do pau. Meu jeito de jogar é esse e eu não vou mudar nunca. Não gosto de ficar parado, gosto mesmo é de ajudar. Por mim, jogava de atacante, mas se o treinador determina que eu fique atrás, eu fico, é uma determinação dele.
        

FP – Ter uma responsabilidade como a de ser Capitão do Centenário é algo novo na sua carreira?


S – No Botafogo eu fui capitão durante seis anos. Assim como o Sport, o Botafogo é uma equipe grande também. Terminei a Série B em 2003 como capitão e líder do time e tive sucesso. Espero ter sucesso dessa vez novamente, apesar de estar mais difícil agora, mas quem sabe, de repente o Santa tropeça ai…. De qualquer maneira, tem o Brasileiro também.
        
FP – Quando o Sport começou a trazer jogadores de renome como você, o Vinícius, o Lúcio, muitos disseram que poderia haver um embate de egos como aconteceu em clubes como o Real Madrid e o Corinthians. O que você acha disso?


S – Aqui isso não acontece. O meu bate-boca com o Maizena ali dentro foi uma coisa que acontece com qualquer time dentro de jogo. É normal. Aqui dentro não tem nenhum desentendimento ou discussão.
        

FP – Você acha que o Sport tem sido prejudicado pelas arbitragens nesse Estadual?


S – Se eu continuar falando disso vou acabar pegando dez anos de suspensão (risos). Porque está na cara de todo mundo. Esse juiz Cláudio Mercante, você viu o pênalti que ele deu para o Santa Cruz no jogo contra o Manchete? Ele deu dois pênaltis horríveis naquele jogo. Sem falar no lance do nosso jogo, que não foi pênalti, pois a falta foi fora da área. O amarelo que ele deu para o Dão também foi horrível. Segurou o menino com cinco minutos de jogo. E o pênalti que não deram para o Náutico contra o Porto? Aquele jogo, se o Náutico ganhasse, ia disputar com o Santa Cruz! O que está acontecendo? O Santa Cruz teve nove pênaltis marcados a seu favor. Não quero tirar os méritos do Santa Cruz não. Agora, nove pênaltis é muita coisa.
        

FP – Em suas últimas declarações, o presidente Luciano Bivar também praticamente jogou a toalha nesse Estadual. Vocês jogadores também?


S – Esse negócio de que o presidente jogou a toalha é por causa da arbitragem. É difícil! O juiz dentro de campo ficava dizendo que ia matar o Cleisson de raiva, isso existe? Como é que ele fala isso para um jogador? E no final ele conseguiu, matou a gente de raiva mesmo. O Santa Cruz está cheio de jogadores pendurados com o terceiro cartão amarelo e só um tomou (Peris), o que é isso, está na cara.
        

FP – Quando o Botafogo caiu para a Segundona você prometeu que iria trazer o time de volta a Série A. Como foi essa passagem que só acabou no fim de 2003, quando o Fogão retornou à Série A?


S – Para mim, aquilo foi melhor do que qualquer título. Quando o time caiu em 2002, quase não joguei porque estava machucado, mas eu participei do último jogo e aquilo ficou marcado. Eu tinha o salário top do Botafogo naquela época e o cortei pela metade. Falei para o presidente (Bebeto de Freitas), ‘vou cortar meu salário pela metade, mas eu lhe prometo uma coisa: eu não vou me machucar, não vou ser expulso, vou colocar o Botafogo na Primeira Divisão e vou fazer dez gols para você’. Então não me machuquei, não fui expulso, levei o time para a Primeira Divisão e marquei oito gols, só faltaram dois. Tudo o que eu prometi cumpri, agora ele não cumpriu o que acertou comigo. Não foi homem comigo como eu fui com ele. O que eu prometi para a nação botafoguense eu cumpri. Por isso que por onde eu passo hoje os torcedores me agradecem, seja em Lisboa ou em Porto de Galinhas.



FP – O que te fez trocar a Europa, onde tinha mais seis meses de contrato, pelo Sport?


S – A proposta do Sport de trabalho e de salário também. O que pesou muito foi o custo de vida em Portugal que é alto demais. Além disso, tudo o que o Sport prometeu para mim cumpriu. Antes de vir para cá eu tive proposta para ir para o Atlético Paranaense. Há uma semana atrás, inclusive, o Atlético Mineiro me ligou seis vezes. Tentaram me convencer dizendo ‘venha para cá, aqui é primeira divisão’, mas eu disse que estou bem no Sport, vou cumprir o meu contrato como prometi ao presidente e vou disputar a Série B pelo Sport. Ninguém me tira do Sport para jogar na Série A. Ninguém vai me tirar daqui, pode escrever o que estou dizendo.
        

FP – Ao longo da sua carreira de jogador, você já morou em outras cidades, como Niterói, no Rio de Janeiro, e Santos, no litoral de São Paulo. A violência do Recife é uma coisa que te assusta?


S – Assusta, e muito. Isso aqui está pesado demais. Mas nós temos que viver não é? Passar o dia dentro de casa. O duro é que a gente fica preso e os assaltantes soltos nas ruas.
        

FP – Você já tem planos para quando deixar o futebol?


S – Quero tomar conta da minha academia e viver a minha vida um pouco mais. Futebol te prende muito. Depois que eu respirar um pouco, ai eu vejo o que eu vou fazer da minha vida. Isso deve ocorrer daqui a uns três ou quatro anos no máximo. Não pretendo sair muito daqui do Recife, não sei se continuo no Sport ou vou para algum outro time. Claro que eu preferia ficar aqui, mas depende muito do momento. A gente nunca sabe, porque futebol é momento.